Liberte-se das expectativas
Você sabia que as expectativas em relação ao trabalho, ao amor, aos filhos, ao que vai acontecer amanhã, podem nos aprisionar? Aprender a não se deixar levar tanto por isso traz mais leveza e prazer para a vida.
Revista Vida Simpes
PORLiane Alves/ Fotografia: Raoni Maddalena
A pct, ou pacific crest trail, é uma trilha selvagem que atravessa nove cadeias de montanhas nos Estados Unidos. Começa no deserto de Mojave, na Califórnia, e termina 1 600 quilômetros depois no Estado de Oregon, perto do Canadá. Para a jovem Cheryl Strayed, decidir enfrentá-la a pé e sozinha parecia ser sua única alternativa para abandonar “uma vida de lama”, provocada pela morte prematura da mãe, um casamento fracassado e o vício da cocaína. Acompanhada de uma mochila e um bastão de esqui, Cheryl partiu para essa jornada dentro de si mesma com um único desejo: libertar-se dos medos provocados pelas suas expectativas.
O que a pct ensinou a ela nessa jornada, descrita no livro Livre (Rocco), foi viver cada dia como se fosse único. Numa trilha selvagem não se pode prever nada e nem se preparar muito para o que pode ocorrer. O encontro com uma cascavel ou um lobo pode acontecer a qualquer momento, ou nunca. Além de um pequeno guia, ela não tinha mais nada com o que contar. O imprevisível estava sempre à espreita.
Pergunto: qual a última vez que treinamos assim com o desconhecido? Com o inesperado? Apenas tente se lembrar qual foi a última vez que decidiu abandonar temores e desejos gerados por suas expectativas e simplesmente se jogou num campo inteiramente novo. Será que você conseguiu se libertar do peso que as expectativas com relação ao futuro nos colocam nos ombros, mesmo que por um breve período? Ou que já pensou em dispensar pelo caminho esse mochilão interno cheio de tralhas que nos faz arrastar com a coluna curvada? Sabe qual foi a última vez em que você sentiu o prazer de soltar as rédeas e deixou de controlar a situação, de manipular e se preocupar, para que as coisas acontecessem do jeito que têm de acontecer?
E para sentir esse gosto de leveza, nem é preciso viagens longínquas. Podemos treinar esse soltar aqui, agora. É só querer. Já pensou como nossa vida se transformaria se não planejássemos tanto? Se decidíssemos prestar atenção mais profundamente a onde ela já está indo, para então decidir se acompanhamos, ou não, o seu rumo? Saborear a vida sem peso a nos levar pelo desconhecido, sem tantos cálculos e movidos apenas pelo prazer de senti-la?
E apresento uma boa razão para abandonar de vez tantas expectativas. Elas partem da nossa avaliação de uma realidade futura a partir da realidade presente. Temos certos dados, os combinamos entre si e temos uma ideia do cenário futuro. Mas seriam nossas avaliações de realidade algo confiável? Serão as expectativas uma boa indicação do que pode acontecer? Dois cientistas americanos, os psicólogos Cristopher Chabris e Daniel Simons, afirmam que não, basicamente porque somos incapazes de perceber até mesmo um gorila pulando à nossa frente.
O gorila invisível
Cristopher e Daniel bolaram uma experiência em que várias pessoas eram convidadas a contar quantos passes alguns jogadores de basquete faziam num vídeo de apenas um minuto. Todos prestavam atenção na contagem dos passes, uns 35.
Depois eram perguntados se tinham notado algo estranho na cena. Metade das pessoas diziam que não. O que era estranho, já que durante nove segundos uma aluna vestida de gorila pulava no meio dos jogadores. Seja porque fosse muito improvável imaginar um gorila no meio da quadra, seja porque as pessoas não conseguiam dividir sua atenção entre a contagem e o que estava acontecendo diante dos seus olhos, a verdade é que metade dos avaliados não conseguia perceber o gorila. É o que se chama de “cegueira inatencional”, um ponto cego que não conseguimos identificar numa situação geral.
Ora, veja que seres pouco confiáveis somos nós ao avaliar uma situação… Não contamos com o imprevisível, mesmo se ele estiver pulando com um gorila diante de nós. Então, como podemos ter tanta certeza de nossa avaliação do que pode acontecer no futuro, se nem vemos o que está acontecendo no presente?
“O problema não é ter expectativas. O problema é acreditar muito nelas”, diz a psicóloga mineira Rosa Bastos Fabretti. “Isto é, o medo e a esperança nos trazem expectativas de coisas boas ou ruins. De certa forma, é normal. O patológico é se agarrar no medo e na esperança, e se deixar alucinar pelasexpectativas”, diz Rosa. “A vida não se expressa apenas dentro da margem estreita do que pensamos que vai acontecer. Isso é querer sufocá-la, criar uma grade interna de segurança e pensar que a existência só vai fluir dentro daquele quadradinho imaginado por nós. Ou ficar apavorado e em pânico quando ela se recusa a ficar enjaulada ali”, afirma.
Esse é um bom motivo para abandonar o amor às suas expectativas: elas são bem menos criativas, generosas e inesperadas do que a vida. Então, cadê a serventia?
Gerência de Benefícios ao Servidor
Gabinete de Gestão de Benefícios ao Servidor e Relações Sindicais